A mediação e o divórcio colaborativo por equipe interdisciplinar nas situações de divórcio: um enfoque construcionista social e pós-moderno
O número de divórcios aumenta a cada ano. Divórcios e casamentos subsequentes é um fato nos dias de hoje a ser considerado com maior abertura.
Ao invés de conotar este dado de realidade negativamente, deve-se explorar formas de melhorar a qualidade de vida das pessoas durante e após suas separações.
O divórcio é uma crise não prevista e bastante complexa no ciclo vital familiar. É um período difícil e doloroso para as partes que estão se separando, e também para os filhos. É uma fase conturbada e estressante, que poderá ser positiva ou negativa, dependendo da forma como o ex-casal conjugal lidará com a situação.
Ahrons1 diz que um divórcio conduzido de maneira positiva é aquele em que pais e filhos mantêm bons relacionamentos, as crianças continuam a ter mãe e pai presentes. Os pais conseguem reorganizar suas famílias e permanecem responsáveis pelas necessidades físicas, emocionais e financeiras dos filhos, em uma parceria cooperativa que preserva os vínculos familiares. A possibilidade de continuidade de relações afetuosas e estáveis das crianças com ambos os pais as auxiliará a atravessar esta fase de forma mais confiante e segura.
O manejo positivo do divórcio implica no aprendizado de habilidades e no empoderamento de recursos pessoais para enfrentar as mudanças e adaptações necessárias. Demanda que as famílias repensem seus modelos familiares; os papéis serão alterados e redefinidos, novas regras deverão ser negociadas e organizadas, diferentes rituais serão criados. Pode-se considerar o divórcio como um momento de transição, no qual as pessoas terão a oportunidade de amadurecer e sair transformadas para melhor.
Os divórcios litigiosos podem ser muito danosos para os envolvidos individualmente e para as relações familiares como um todo. Geralmente, estes processos são iniciados com disputas, acusações e a construção de provas de um contra o outro, em um contexto competitivo onde se digladiam em uma arena na perspectiva de um sair “ganhador” e o outro “perdedor”. As demandas são baseadas somente nos posicionamentos pessoais, sem o olhar para a preservação das relações, para um valor comum a todos. Este tipo de processo adversarial envolve questões familiares antagônicas e todos saem perdendo. Não há vencedores.
A Mediação e o Divórcio Colaborativo favorecem um contexto cooperativo, flexível e criativo. São práticas dialógicas focadas na corresponsabilidade, no protagonismo das partes, e na construção conjunta dos processos decisórios. Desta maneira, os participantes têm a oportunidade de estabelecerem as regras que irão nortear suas vidas e a dos filhos, e também de decidirem o que consideram justo e injusto sobre as próprias necessidades, ao invés de submeterem-se à decisão judicial, a qual não é satisfatória e nem abrangente na maioria das vezes.
A Abordagem Colaborativa Baseada nos Pressupostos Pós-Modernos e Construcionistas Sociais
Uma das características mais importantes da vida é a conversa. Estamos em contínuas conversações com os outros e conosco. Por meio de conversas, formamos e reformamos nossas experiências de vida e os eventos, criamos e recriamos nossos significados e compreensões e construímos e reconstruímos nossas realidades e nosso self 2. Algumas conversas ampliam possibilidades; outras diminuem. Quando as possibilidades aumentam, temos uma sensação de agência, uma sensação de que podemos tomar a atitude necessária para tratar do que nos preocupa ou nos atormenta: nossos dilemas, problemas, dores e frustrações, e para realizar o que desejamos: nossas ambições, esperanças, intenções e ações.3
A essência dos processos colaborativos é o diálogo - a conversação generativa e dinâmica por meio da qual há espaço para todas as vozes, cada pessoa está completamente presente, há intercâmbio bidirecional e cruzamento de ideias, pensamentos, opiniões e sentimentos. A ênfase está na linguagem e nos sentidos trazidos pelas pessoas, e o foco na compreensão das questões, por meio de uma análise dos relacionamentos nos quais elas estão envolvidas e nos quais constroem sentidos singulares4.
As Práticas Colaborativas podem ser compreendidas como uma forma de “estar no mundo”, uma atitude frente à vida, que valoriza e respeita todas as outras formas de “estar no mundo”, eleitas pelas pessoas com as quais nos relacionamos, no dia a dia pessoal e profissional. É uma forma de interagir atenta, interessada, curiosa, flexível e responsável, com ênfase nos processos dialógicos e no seu contexto de ocorrência. Sheila McNamee5 fala do construcionismo social como uma postura filosófica que o individuo assume. É uma forma de se pensar sobre os processos conversacionais com um foco especial na expansão dos entendimentos e construção comum de significados.
De acordo com o pensamento pós-moderno, a singularidade é uma unidade de referência. Desse modo, cada pessoa é concebida como única e singular, e traz seus próprios valores, crenças, conhecimento, experiências e recursos para seus espaços conversacionais. Os profissionais colaborativos respeitam e tentam compreender a forma com que cada cliente constrói e descreve seu mundo, valorizando e incluindo suas diferenças. Estes profissionais vão “caminhar junto” com seus clientes, explorando como estes veem e creem que sejam seus “problemas”, refletindo com eles, ampliando e construindo conjuntamente possibilidades e soluções para o seu manejo, acompanhando-os no trilhar de um novo caminho.
As Práticas Colaborativas estão atentas para que todos participem igualmente, sentindo-se acolhidos, reconhecidos, compreendidos, e empoderados ao longo das conversações e de todo o processo. Propiciam que as pessoas expliquem de forma detalhada tudo o que consideram importante, e que potencializem suas próprias competências para o manejo e/ou solução de suas questões. A ideia é motivar a curiosidade dos envolvidos no sentido de que compreendam a coerência da perspectiva do outro. Espaços e processos de diálogo são criados para favorecer a conexão entre os participantes, em uma atmosfera de colaboração, com o foco na construção conjunta de novas possibilidades e soluções para suas questões, bem como de realidades futuras.
O profissional colaborativo quer construir um contexto de confiança no qual as partes se escutem e se respeitem, e que possam compreender mutuamente o sentido de cada posição, por mais que discordem das mesmas. Este profissional convida à reflexão, estimula as partes para que se engajem em uma investigação autorreflexiva e relacional. Ele é um coordenador de multiplicidades6, posto que irá coordenar múltiplos pontos de vista, realidades, posições, interesses e valores para que possam coexistir.
A Mediação de Conflitos e o Divórcio Colaborativo por Equipe Interdisciplinar
O presente artigo apresenta dois recursos para se trabalhar de maneira colaborativa em um divórcio: a Mediação de Conflitos e o Divórcio Colaborativo por Equipe Interdisciplinar.
Ambos trazem diversos benefícios: (i) o custo emocional, financeiro e de tempo são sempre menores que no processo litigioso; (ii) as emoções e os sentimentos são acolhidos e trabalhados com o foco na situação a ser tratada; (iii) o custo financeiro é sobre o valor das reuniões e da consulta a especialistas, podendo em algumas instituições ser cobrada uma taxa de administração; (iv) o tempo gasto com a realização dos mesmos também costuma ser bem menor do que no Judiciário.
A Mediação e o Divórcio Colaborativo também permitem que seus participantes acessem e tratem de maneira funcional os aspectos legais, financeiros, emocionais e pessoais relacionados aos diversos temas e necessidades envolvidos na complexidade do seu divórcio, focando na solução de temas e no desenvolvimento positivo da família, evitando, assim, as desvantagens do processo litigioso e adversarial. Em um contexto colaborativo de divórcio, pais e filhos tendem a sofrer menos, elaborar suas questões emocionais mais rapidamente e a ter melhores relacionamentos após o divórcio. Crianças e adolescentes ficam protegidos dos aspectos mais devastadores de uma ruptura nas relações familiares.
Os dois procedimentos são voluntários. As partes elegem se um deles será o instrumento que querem utilizar para a solução de suas questões. Quando no âmbito privado, escolhem também os profissionais que os acompanharão. Poderão decidir pela interrupção em qualquer momento.
A Mediação e o Divórcio Colaborativo têm caráter confidencial. Esta característica os tornam contextos seguros para a livre expressão das partes, com a possibilidade de ampliação dos temas a serem tratados, e a construção de pautas objetivas e subjetivas. As informações necessárias circulam de maneira aberta, sem artimanhas para enganar ou construir provas de um contra o outro.
São instrumentos que privilegiam o diálogo e, portanto, tendem a melhorar a comunicação entre todos. Um de seus focos é o resgate ou incremento da comunicação do par parental, e também dos demais canais comunicacionais familiares. Com isto, o desgaste emocional de todos é reduzido, e aumenta a possibilidade do trabalho para se pensar as adaptações necessárias e os planos futuros a serem viabilizados.
Uma das prioridades da Mediação e do Divórcio Colaborativo é o cuidado e a preservação das relações familiares por meio de um diálogo respeitoso e produtivo, no qual soluções participativas são pensadas e elaboradas considerando-se os interesses de forma abrangente. Para tal, toda a rede de pertinência e a relevância dos envolvidos são consideradas, incluindo-se além dos filhos, as famílias extensas, como avós e/ou outros membros importantes, para que resultados benéficos se mantenham no tempo ou sejam construídos.
Como as partes são as protagonistas e responsáveis por tudo que é tratado e construído durante os dois procedimentos, bem como pelo seu resultado, a possibilidade de que um acordo amplo e detalhado seja elaborado, e que o seu cumprimento seja efetivo é muito maior do que quando a controvérsia é decidida por um terceiro.
Os benefícios destes métodos para o Judiciário devem ser ressaltados. O seu potencial positivo vai desde a redução do número de processos, por evitar os novos e/ou encerrar os vigentes, ao seu poder pedagógico em habilitar seus participantes para a prevenção e resolução de conflitos futuros.
A Mediação
A Mediação surgiu nos E.U.A. nos anos 70, e as estatísticas neste país apontam para um resultado positivo de 80% de acordos nos casos encaminhados. A Mediação pode acontecer antes, durante, ou mesmo depois dos processos judiciais. Especialmente nos casos de família e de divórcio, o ideal é que ocorra antes, e que o Judiciário seja recurso somente no momento da homologação do provável acordo. Se a Mediação acontecer em paralelo a outros processos, a experiência aponta para interferência negativa em seu caminhar colaborativo. A partir dessa avaliação, recomenda-se que todos os processos em curso sejam suspensos durante a Mediação, tanto para evitar interferências nocivas, como também para permitir que outros acordos, ou um acordo amplo, englobando todos os processos, possa se dar.
A Mediação é um instrumento de resolução de conflitos por meio do qual as partes são as autoras de soluções de benefício mútuo para suas questões. No contexto de um trabalho colaborativo do divórcio, o mediador é um facilitador da comunicação entre os participantes, que atua utilizando técnicas de comunicação e de negociação, orientado por uma visão pós-moderna e construcionista social. O foco é no futuro e na construção de alternativas que satisfaçam a todos. É um processo confidencial. Os mediadores e as partes têm o compromisso de não utilizarem nada tratado durante a Mediação em outros processos ou futuros litígios. Os mediadores também não podem ser convocados para prestar nenhum testemunho em eventuais desdobramentos litigiosos envolvendo os mediandos .
O mediador atua como um terceiro imparcial, e para tal não pode ter nenhum conflito de interesses com o tema em questão, e tampouco conhecer ou já ter atuado profissionalmente com uma das partes. Se já teve alguma relação profissional com os mediandos, esta variável deve ser conversada para checar como se sentem, e decidir em conjunto se dará continuidade ao processo. O mediador manterá uma postura equidistante dos interesses e necessidades das partes, com o cuidado para que seus valores e crenças não interfiram no andamento da Mediação.
O mediador pode e deve atuar em co-mediação com outro profissional, preferencialmente de outra área do conhecimento. Nos casos de divórcio, uma combinação interessante na formação de duplas é ter um mediador da área da saúde e um do direito. O mediador recebe uma capacitação adequada, aprende e desenvolve habilidades, competências e ferramentas para atuar de forma eficaz, diligente e com credibilidade.
A Mediação é estruturada em etapas, as quais muitas vezes se mesclam, mantendo o encadeamento funcional. Estas etapas são: a) Pré-mediação: na qual o mediador apresenta as características do instrumento para verificar a vontade dos participantes em colaborarem e reverem posições. Também nesse momento, o mediador avalia se a Mediação é o instrumento adequado para o caso, se sente competência para a condução do mesmo, se acha necessário a co-mediação e se há concordância de todos para se iniciar o processo; b) Discurso de Abertura: alguns aspectos da Mediação são reforçados e as regras para um bom andamento do processo são negociadas e construídas; c) Relato das Histórias: neste momento, as partes contarão sobre a sua visão relacionada ao conflito, e o mediador, capacitado em técnicas de comunicação, auxiliará a ampliar perspectivas e a identificar os temas de pauta, assim como as necessidades, interesses e valores envolvidos; d) Ampliação, Construção e Negociação de Alternativas: nesta etapa, após a construção das pautas objetivas e subjetivas, alternativas e possibilidades para os temas pautados são pensadas, construídas e avaliadas; e) Fechamento do Processo: a finalização da Mediação pode se dar por um acordo total ou parcial, formal ou informal, provisório ou não, ou mesmo sem acordo. Quando a Mediação é judicial ou a homologação pelo Juiz faz-se necessária, como na maioria dos temas em um divórcio, o acordo é revisto em seus aspectos legais pelos advogados das partes.
O Divórcio Colaborativo por Equipe Interdisciplinar
O Divórcio Colaborativo também surgiu nos EUA, como resultado das concepções do advogado Stuart Webb e da psicóloga Peggy Thompson acerca de uma prática que fosse ao encontro de um novo olhar sobre o conflito: como uma oportunidade de transformação positiva. Tesler e Thompson7 propõem uma abordagem em equipe interdisciplinar, com uma condução adequada a partir da qual se possam gerar resultados satisfatórios, construídos em um contexto seguro e de colaboração.
Este procedimento é realizado, preferencialmente, antes da entrada do pedido de divórcio no Judiciário. Nos E.U.A. e em alguns outros países da Europa, os métodos extrajudiciais de resolução de conflitos são mais conhecidos, as pessoas já procuram estes recursos voluntariamente. Aqui no Brasil, as partes que optam pelo Divórcio Colaborativo, geralmente, são orientadas por advogados que atuam de forma colaborativa, bem como por terapeutas e amigos conhecedores da prática.
Os advogados colaborativos não atuam de forma adversarial. No início do processo é assinado um termo onde se comprometem a exercerem seu papel colaborativamente, não podendo em nenhum momento futuro, caso o Divórcio Colaborativo não dê certo, atuarem de forma litigiosa. Trabalham prestando assessoria legal, mas com o objetivo de auxiliar na construção de uma solução de beneficio mutuo, conduzindo uma negociação baseada em interesses. Os advogados utilizarão o Judiciário somente no momento de homologação do acordo.
Advogados, coaches8, consultores financeiros e especialistas em desenvolvimento infanto-juvenil, capacitados na utilização das ferramentas da Mediação de Conflitos e nas Práticas Colaborativas no Direito de Família, auxiliarão as partes a compreenderem e trabalharem emoções, sentimentos, e a diversidade de aspectos e temas envolvidos na situação do divórcio, como também a desenvolverem uma comunicação respeitosa, positiva e eficiente, para dialogarem sobre seus interesses e necessidades, sobretudo quando da presença de filhos. No Divórcio Colaborativo, os papeis parentais são privilegiados para além dos conjugais.
No processo das Práticas Colaborativas cada parte tem um coach e um advogado. As partes iniciam com reuniões individuais com esses profissionais, preparando-se para o momento das reuniões conjuntas. Um dos objetivos principais das reuniões individuais é a preparação para reuniões conjuntas efetivas, de modo que estas alcancem os resultados esperados. Neste início, será identificada a necessidade de contratação de um especialista em finanças e/ou um especialista em desenvolvimento infanto-juvenil. Na fase das reuniões conjuntas estarão presentes as duas partes, os dois advogados, e se necessário, os dois coaches.
Os participantes sabem desde o início do processo que a equipe trabalhará de forma interdisciplinar, compartilhando informações e pensando conjuntamente os melhores passos para um desfecho positivo.
Os envolvidos em um turbilhão de sentimentos e tarefas para lidar e resolver necessitam fortalecer, desenvolver e construir habilidades para trabalhar com a diversidade de temas que surgem ao longo desta fase. O coach, conjuntamente com o advogado, vai ajudar na identificação e priorização dos temas, questões, interesses, necessidades e valores envolvidos na controvérsia, e importantes de serem tratados. As principais negociações costumam versar sobre a responsabilidade compartilhada (guarda), convivência parental (visitação), manutenção financeira (alimentos) e divisão de bens (partilha).
O coach irá auxiliar na compreensão e elaboração dos aspectos emocionais, relacionais e comunicacionais envolvidos nas questões do divórcio. As partes necessitam reconstruir suas vidas, preservando a família e também cuidando dos aspectos práticos e objetivos mais importantes para este fim. Seu trabalho se dá especialmente com foco na melhoria da comunicação; investe nas formas de escutar e falar com a outra parte. Trabalha padrões funcionais e disfuncionais.
Um dos principais focos do coach é a construção de uma co-parentalidade colaborativa e funcional. O coach reflete com e orienta os pais no entendimento e manejo das questões, interesses e necessidades relacionadas aos filhos. Considerando o amplo contexto da família, pensará e articulará com seus clientes as singularidades e possibilidades para uma convivência positiva dos filhos com os pais e a família extensa.
Advogados e coaches possibilitam a construção de um contexto e manejo colaborativo e respeitoso para lidar com o processo, com foco em resultados positivos e em como planejá-los e torná-los realidade, com uma perspectiva de futuro promissor. Auxiliam as partes no preparo para as reuniões conjuntas e para o momento de negociação das soluções e possíveis acordos.
Reflexões Finais
A perspectiva pós-moderna, construcionista social e colaborativa parece constituir um embasamento teórico-prático bastante apropriado para a condução do processo de divórcio. Mediadores e demais profissionais do Divórcio Colaborativo, que atuam com esta visão de vida, acreditam que a sua postura será a de convocar as pessoas para relacionamentos e processos colaborativos. Veem-se como especialistas em criar e facilitar espaços de diálogos, por meio dos quais irão se informar com os participantes; eles não terão respostas a priori; supõem que as parcerias podem se dar entre pessoas com perspectivas e conhecimentos diferentes; acreditam na criatividade e contribuições de todos para a solução dos conflitos, e que serão co-investigadores, juntamente com os seus clientes, os quais participarão da criação do que “descobrem”.9
A Mediação e o Divórcio Colaborativo são recursos com um enorme potencial quando se considera seus efeitos positivos para a elaboração e desdobramentos do divórcio. Para os filhos, trazem a oportunidade de terem seu desenvolvimento físico e mental preservado dentro de um contexto estável, o qual considera e cuida de todas as necessidades envolvidas. E para o ex-casal conjugal, além de inaugurarem uma nova parceria colaborativa relacionada à parentalidade, propiciam transformarem-se como pessoas, valorizando sua própria história e seu preparo para a superação desta fase.
A eleição de um destes instrumentos para a condução do processo de divórcio, ao invés do processo judicial, muda radicalmente a natureza dos relacionamentos durante este período. São extremamente potentes para cuidar das necessidades relacionadas à convivência familiar devido ao seu caráter dialógico e colaborativo e ao seu objetivo comum relacionado à construção de consenso, “entendendo-se como tal um acordo geral de todos os participantes, relativo a um conjunto de decisões e/ou recomendações que contemplem interesses, necessidades e valores de todos os envolvidos”.10
O formato dos dois recursos é diferente, apesar da possível flexibilidade em função das singularidades de cada caso. A Mediação é iniciada, preferencialmente, com reuniões conjuntas, e as reuniões individuais acontecem somente quando necessárias. O Divórcio Colaborativo tem seu início com reuniões individuais com os advogados e/ou coaches, para a preparação da reunião conjunta.
Os papéis do mediador e dos profissionais do Divórcio Colaborativo têm algumas distinções, apesar de ambos trabalharem a partir de uma postura construcionista social e possuírem como objetivo comum a construção de consenso. O mediador, ou a dupla de mediadores, são terceiros imparciais, e seu papel é o de facilitador da comunicação e negociação entre as partes. No Divórcio Colaborativo, cada parte tem seu coach e seu advogado, que não se pode dizer trabalham de maneira imparcial, pois prestam orientação técnica e têm um papel mais determinante na condução dos processos.
Na Mediação recomenda-se que seus participantes estejam assistidos por seus advogados. É fundamental sua participação no início, para dar apoio ao processo cooperativo; durante, para prestar assessoria e acompanhar as negociações e acordos que vão sendo construídos; e no seu final, para a revisão da redação, considerando os aspectos legais e normas jurídicas. A consulta a outros especialistas e a forma de participação destes na Mediação é opcional e negociada pelos mediandos e mediadores.
Apesar da recomendação de que em conflitos familiares a dupla de mediadores seja constituída por um advogado e um profissional de saúde, esta situação não é regra e muitas vezes não é possível. Nestes casos, a procura de especialistas de fora do processo geralmente faz-se necessária. Na situação ideal de dupla, apesar de não prestarem assessoria especializada, os mediadores têm um olhar, e atuam como agentes de realidade, trazendo perguntas e questões pertinentes às questões em pauta.
O Divórcio Colaborativo é realizado por equipe interdisciplinar durante todo o processo, e estes profissionais atuam a partir das suas especialidades e da sua capacitação em Práticas Colaborativas no Direito de Família. Trabalham de maneira complementar nos conflitos em seus aspectos emocionais, relacionais e/ou jurídicos, com a vantagem de trocarem impressões e apoio, e tomarem decisões conjuntas todo o tempo, com a ciência prévia deste formato de funcionamento por parte dos clientes.
Pode-se pensar que, nos divórcios que envolvem aspectos legais e financeiros muito complexos e/ou quando as partes têm necessidade do acompanhamento dos profissionais para resguardar seus interesses e guiar todos os passos do processo, o Divórcio Colaborativo seja o instrumento mais recomendável. É possível ponderar também sua recomendação nos casos em que o desbalance de poder na relação entre os cônjuges data de muito tempo e um deles, ou ambos, sentem-se em desvantagem nas conversas sobre temas difíceis e complexos.
Enfim, os mediadores e os profissionais colaborativos compartilham várias aspirações e objetivos comuns, e também possuem habilidades e competências comuns dentro das singularidades de cada instrumento. Ambos estão preocupados com a humanização do divórcio, a promoção da paz e o bem estar dos envolvidos.
Referências Bibliográficas
AHRONS, Constance R. O bom divórcio: como manter a família unida quando o casamento termina. Rio de Janeiro: Objetiva, 1994.
ANDERSON, Harlene. Conversação, linguagem e possibilidades: um enfoque pós-moderno da terapia. São Paulo: Roca, 2010.
McNAMEE, Sheila. Um estudo socioconstrucionista da expertise terapêutica. Revista Nova Perspectiva Sistêmica, n. 31, julho de 2008, p. 34-43. Rio de Janeiro: Multiversa, Instituto NOOS e Instituto Familiae.
TESLER, Pauline H., THOMPSON, Peggy. Collaborative divorce: the revolutionary new way to restructure your family, resolve legal issues, and move on with your life. New York, N.Y.: HarperCollins Publishers, 2006.
Bibliografia Adicional
GRANDESSO, Marilene Aparecida. Sobre a reconstrução do significado: uma análise epistemológica e hermenêutica da prática clínica. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
GUANAES-LORENZI, Carla; MOSCHETA, Murilo S.; CORRADI-WEBSTER, Clarissa M.; SOUZA, Laura Vilela e (Orgs.). Construcionismo social: discurso, prática e produção do conhecimento. Rio de Janeiro: Instituto NOOS, 2014.
HAYNES, John M. Fundamentos de la mediación familiar. Madrid: Gaia, 1995.
IRVING, Howard H.; BENJAMIN, Michael. Family mediation: contemporary issues. Thousand Oaks, California: Sage Publications, 1995.
WEBB, Stuart G.; OUSKY, Ronald D. The collaborative way to divorce: the revolutionary method that results in less stress, lower costs and happier kids – without going to court. New York, N.Y.: Plume, 2006.
1 Ver em AHRONS, Constance R. O bom divórcio: como manter a família unida quando o casamento termina. Rio de Janeiro: Objetiva, 1994.
2 Anderson diz que a mente individual é uma composição social e o self, portanto, torna-se uma composição social relacional. Ver em ANDERSON, Harlene. Conversação, linguagem e possibilidades: um enfoque pós-moderno da terapia. São Paulo: Roca, 2010, p. 4.
3 Ver em ANDERSON, Harlene, 2010, ob. cit., Prefácio XVII.
4 Conversa pessoal com Marilene Grandesso durante o IV Certificado Internacional em Práticas Colaborativas e Dialógicas, Interfaci, São Paulo, 2014.
5 Ver em McNAMEE, Sheila. Um estudo socioconstrucionista da expertise terapêutica. Revista Nova Perspectiva Sistêmica, n. 31, julho de 2008, p. 34. Rio de Janeiro: Multiversa, Instituto NOOS e Instituto Familiae.
6 Termo utilizado por Sheila McNamee, durante o Workshop: Diálogo, Práticas Colaborativas e Transformação Social, Interfaci, São Paulo, 2014.
7 Ver em TESLER, Pauline H.; THOMPSON, Peggy. Collaborative divorce: the revolutionary new way to restructure your family, resolve legal issues, and move on with your life. New York, N.Y.: HarperCollins Publishers, 2006.
8 Utiliza-se o termo coach para designar o profissional de nível superior, da área da saúde ou com formação em coaching, e com a capacitação em Divórcio Colaborativo.
9 ANDERSON, Harlene, 2010, ob. cit.
10 Definição apresentada por Tania Almeida, durante o 1º. Encontro Interestadual de Mediação realizado em Friburgo em 2014.
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